Nos termos do art.
37, II e III da CF/88, a investidura em cargo ou emprego público depende de
aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos que terá
validade de até 2 anos, prorrogável, uma única vez, por igual período. Durante
a validade do concurso, o inciso IV do referido artigo assegura a preferência de convocação dos concursados.
Nesse contexto, de
maneira bastante completa, Hely Lopes Meirelles define o concurso
público como “…o meio técnico posto à disposição da Administração Pública para
obter-se moralidade, eficiência e aperfeiçoamento do serviço público
e, ao mesmo tempo, propiciar igual
oportunidade a todos os interessados que atendam aos requisitos da lei, fixados de acordo
com a natureza e complexidade do cargo ou
emprego, consoante determina o art. 37, II, da CF. Pelo concurso afastam-se, pois, os ineptos e os apaniguados
que costumam abarrotar as repartições, num espetáculo degradante de
protecionismo e falta de escrúpulos de políticos que se alçam e se matem no
poder leiloando cargos e empregos Públicos” (Direito administrativo
brasileiro, 30ª ed., Malheiros, 2005, p. 419 - grifamos).
Não restam dúvidas
que o objetivo da regra constitucional é aniquilar qualquer forma de
protecionismo ou favorecimento.
Pois bem, como todos
sabem, as regras do concurso público devem estar minuciosamente descritas no Edital do Concurso, que passa a ser
documento essencial para se atingir os ditames constitucionais, devendo a banca
estar atrelada aos seus vetores.
Isso posto, surge a
pergunta: o candidato aprovado em concurso público tem direito a nomeação?
O STF, em decisão
extremamente importante, em 10.08.2011,
decidiu, no julgamento do RE
598.099, que se a aprovação for dentro do número de vagas previsto no
Edital e dentro do prazo de validade do concurso, o candidato terá sim o direito
à nomeação.
(...) “...o Estado
não pode brincar com cidadão. O concurso público não é o responsável pelas
mazelas do Brasil, ao contrário, busca-se com o concurso público a lisura, o
afastamento do apadrinhamento, do benefício, considerado o engajamento deste ou
daquele cidadão e o enfoque igualitário, dando-se as mesmas condições àqueles
que se disponham a disputar um cargo”. “Feito o concurso, a administração pública não pode cruzar os
braços e tripudiar o cidadão”(Notícias STF, 10.08.2011).
Como todos sabem, ao
se publicar um Edital de Concurso, a administração provoca, dentre outras
coisas, a mudança na vida do cidadão que confia na administração e se predispõe
a buscar aquela tão sonhada vaga.
O impacto é brutal. Muitos alteram o curso de suas
vidas em busca daquele grande sonho. As renúncias são inevitáveis.
O isolamento, necessário e inerente
à tomada de decisão, muitas vezes penitencial.
Isso tudo leva as pessoas a testar os seus limites.
E, como se disse, o
estopim dessa mudança de comportamento é a expectativa decorrente da abertura
do concurso com a fixação do número das tão sonhadas vagas a serem preenchidas.
A Administração não
pode “brincar” com a vida das pessoas. Se o candidato tem os seus deveres, e
olha que são muitos, como horário, regras durante a prova e tantas outros, a
Administração também deve estar atrelada aos termos do Edital.
Qualquer outro
entendimento, sem dúvida, caracterizaria afronta à segurança jurídica,
acarretando, por consequência, ultraje ao princípio
da confiança (Treue und Glaube),
destacando-se aqui um componente de
ética jurídica aplicado às relações
de direito público como já vinha sendo sustentado pelo STF (cf. MS
22.357, Rel. Min. Gilmar Mendes).
Dessa forma, podemos
dizer que deverá haver uma inversão
do ônus da prova para eventual não contratação por parte da
Administração.
Ou seja, por regra,
a Administração tem o dever de
contratar nos termos do Edital e dentro do número de vagas previstos no Edital.
Diante de situações excepcionalíssimas, e apenas
nessas circunstâncias, poderá, de
maneira motivada (e, assim, passível de controle jurisdicional),
deixar a Administração de honrar a expectativa criada.
Para o Min. Gilmar
Mendes, essa excepcionalidade deve ser marcada por indispensáveis características,
destacando-se: superveniência,
imprevisibilidade, gravidade e necessidade.
Finalmente, fica o alerta: o princípio do concurso público tem força normativa e surge no texto de 1988 como destacada conquista da cidadania.
Portanto, não poderá
ser desvirtuado, especialmente, agora, diante da importante decisão que
reconhece o direito subjetivo à
nomeação.
Então, em situações
concretas e muito particulares, parece-nos possível vislumbrar eventual
incompatibilidade entre o cadastro
(desarrazoado) de reserva e a necessária observância ao princípio do concurso público.
Isso porque, se em
tese não há vagas a serem preenchidas no momento da abertura do Edital,
conclusão essa decorrente da decisão de a Administração abrir o concurso apenas para o cadastrado de
reserva, caracterizado estará o nefasto
desvio de finalidade.
Isso sem contar
algumas situações em que concursos exclusivamente para o cadastro de
reserva são feitos com propósitos meramente arrecadatórios (em total
afronta à moralidade administrativa)
ou diante de quadro de flagrante e brutal necessidade de preenchimento de vagas
e contratação.
É algo que
precisamos pensar melhor e rogamos que o cadastro
de reserva não se transforme na regra dos certames.
Nessa linha, podemos
lembrar a PEC 483/2010 que,
alterando o art. 37, II, veda a
realização de concurso público exclusivamente para a formação de cadastro
de reserva.
Pois bem, apesar de
o art. 12 do Dec. n. 6.944/2009 estabelecer a excepcionalidade do cadastro
de reserva, a rotina dos “concurseiros” já é muito penosa para que, diante
de tantas dificuldades, essa prática se torne mais um fator a agravar o
desgastante sentimento de insegurança e incertezas. Então, sendo bem direto e
com o máximo respeito: “morte” ao
cadastro de reserva!
FONTE: http://pedrolenza.blogspot.com.br/2011_09_01_archive.html
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